6.5.09

O voto em branco

Aproxima-se mais uma vaga de eleições. Já se discute em quem votar e porquê. Qual a melhor maneira de fazer representar os nossos interesses aos vários níveis das decisões políticas? Numa coisa tenho encontrado concenso: Os nossos políticos não inspiram confiança. É generalizada a descredibilização da classe política em Portugal. E não só... (tirando o Obama)
O que fazer? Em quem votar?
Entre os muitos que, reclamando, dizem que nem sequer vão votar, há aqueles que dizem com convicção: "Vou votar em branco!" Agora: o que é que muda ao não votar e ao votar em branco? Diz-se que o voto em branco é um voto de descredibilização a toda a classe política. Concordo.
Mas o que é que acontece na prática?
Lembram-se das noites eleitorais? Lembram-se do que acontece aos votos em branco?
Para a nomeação dos deputados, vereadores e euro-deputados contam o mesmo que a abstenção: são excluídos! Podem dizer que houve tantos por cento de votos em branco e durante uma semana fazerem entrevistas sobre isso mas, essa percentagem de eleitores, que não quis nenhum dos candidatos a representá-la, será desintrepertada.


Passo a explicar a título de exemplo:
Imaginemos uma eleição legislativa. De um universo de 10'000'000 de eleitores, apenas 5'000'000 se dão ao trabalho de ir às urnas. Temos, então, 50% de abstenção que será interpretada como um desinteresse pela causa e, por isso, excluídas na atribuição dos cargos. Ou seja: 5'000'000 é agora 100% da "vontade do povo".
Dos que foram às urnas, 1'750'000 votou no partido A, 2'000'000 votou no partido B e 1'250'000 votou em branco. Assim, lemos na "vontade do povo" que 35% está pelo partido A, 40% pelo partido B e que 25% está insatisfeito com os partidos.
É assim que eu vejo que um resultado destes é interpretado em Portugal: os votos em branco são postos de lado para a atribuição dos cargos. Assim, 3'750'000 eleitores vêem o seu poder amplificado e são os únicos a decidir. Atribuem maioria absoluta ao partido B com 53,33%. Supondo que a Assembleia tem 100 lugares e seguindo a regra dos arredondamentos matemáticos, 53 lugares são atribuídos ao partido B e 47 ao A. As leis do partido do governo serão fácilmente aprovadas com a sua maioria parlamentar e os seus projectos terão uma legitimidade acrescida, pois é um governo de maioria parlamentar.
Ora, é assim que eu entendo que este resultado eleitoral havia de ser interpretado: os votos em branco contam como lugares vazios na Assembleia. O partido B já não teria a maioria absoluta e ficaria reduzido a apenas 40 lugares de deputado, o partido A com 35 e os restantes 25 estariam vazios. Para as leis serem aprovadas, teria de haver concenso entre membros dos dois partidos ou então, nenhuma decisão seria publicada. A classe política teria de se esforçar mais para reduzir o "espaço vazio" de decisão. Novos partidos, mais pequenos, emergiriam.
No fundo, não vejo lógica no facto de 12,5% dos eleitores se dar ao trabalho de ir votar, mostrar interesse, votar em branco e o lugar que à sua vontade é reservado ser ocupado pela dilatação dos partidos que optou não votar.
Para conseguir tornar isto matemáticamente ridículo, passo a exemplificar em números. Começando pelo universo de eleitores de 10 milhões, temos 50% de desinteressados, 12,5% de insatisfeitos (voto em branco), 17,5% pelo partido A e 20% pelo partido B. Quando passa pelo "filtro" da "vontade do povo" (só quem tem interesse é que decide), duplicam-se as percentagens. 25% em branco, 35% pelo A, 40% pelo B. Quero sublinhar que foram eleitores que decidiram expressar a sua vontade indo às urnas. Ora, um quarto dessas pessoas (25%) é excluída e o seu poder é dividido pelos partidos. O poder de um quarto dos cidadãos é multiplicado por zero e o dos que votaram num dos partidos é multiplicado por 1,33(3). Isto faz com que cada pessoa que tenha votado nos partidos valha uma pessoa e um terço, 3 pessoas valeriam por 4. Enquanto que a voz dos que votaram em branco é reduzida a zero.

Daí que eu ande por aí a pregar os perigos do voto em branco, pois, ao fazê-lo, estaremos a amplificar o poder dos eleitores que votam em qualquer partido.

Não acho que seja essa a intenção de quem vota em branco, pois não?

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